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segunda-feira, 21 de julho de 2014

Agora tem Cota de Cinema Brasileiro até para Sala de Aula

Ei, tô começando a gostar desse negócio aí de filme nacional!


A exibição de filmes de produção nacional por, no mínimo, duas horas mensais, agora é obrigatória nas escolas de ensino básico. É o que determina a lei 13.006/14 sancionada pela presidente Dilma e publicada no DOU no dia 27/06/2014.

Estamos entrando no coração das trevas, como diria Joseph Conrad. "Por quê?" você diria. Primeiro, leia isso aqui (os trechos que não estão em negrito foram tirados dos artigos listados no final do post): 

Pelo menos 43 mil escolas brasileiras não estão preparadas para atender à nova lei que determina a exibição mensal de, pelo menos, duas horas de filmes produzidos no Brasil (Lei Federal [13.006/14] em vigor desde 26/06/2014, foi publicada no dia 27/06/2014 no Diário Oficial da União.). O número corresponde às instituições que não têm televisão, de acordo com o Censo Escolar de 2013. O número aumenta quando se trata de aparelhos de DVD – do total de 190,7 mil colégios, mais de 48 mil não têm o equipamento. Em relação aos retroprojetores, que também podem ser usados na exibição de filmes, apenas um terço (63 mil) tem o equipamento.

Isso já é um fator bastante negativo, já que a lei, que em tese, é para todas as escolas, só vai poder ser cumprida nas escolas MAIS RICAS, de regiões MAIS RICAS. Ou seja, não vai ser algo feito de maneira realmente democrática e igualitária, vai ser feito nas coxas, como tudo aqui no Brasil.

Outro ponto:

Para o professor da Universidade de São Paulo (USP) Marciel Consani, a exibição dos filmes em todas as escolas do país será "uma tarefa desafiadora". "Não há um hábito de ir ao cinema para ver filme brasileiro", diz ele, que é especialista em educomunicação. "A escola é uma plataforma interessante para criar esse hábito. Mas isso tem que ser feito da maneira correta, amparada metodologicamente, para que não se consiga o contrário, traumatizar os jovens com filmes maçantes e desinteressantes."

Um filme, segundo Consani, é um produto indivisível que deve ser analisado como obra completa. A exibição de trechos de filmes para que se dê tempo de analisá-los em uma aula pode ser algo danoso. A sugestão para tempos menores é que os professores escolham média e curta-metragens. Outra preocupação é não usar como verdade filmes que contenham erros históricos, por se tratarem de adaptações.

Usar curtas e médias? Hum-hum... Segundo o professor, vai ser necessário, além de equipamentos, um acompanhamento pedagógico afiado para que isso não se torne apenas a "hora da soneca" para os alunos. Coisa que nós já sabemos... que não vai acontecer. O pessoal vai jogar um filminho (considerando que a escola tenha o equipamento) e seja o que Deus quiser... bastante animador. Vamos ressuscitar o Primo Carbonari (se não sabe quem é, dê uma procurada no Google)!

Para finalizar:

Ainda que a cota de duas horas mensais não faça parte do planejamento das escolas, muitos professores já utilizam os filmes nacionais para complementar o aprendizado. Esse é caso do professor Renato de Faria, que leciona filosofia e sociologia no Colégio Santo Agostinho. Nas aulas dele, o filme sempre complementa a temática que está em discussão na sala de aula. “O filme entra para exemplificar. Depois, fazemos trabalhos e debates”.

O Colégio Santo Agostinho é um colégio particular situado em bairro de classe média de São Paulo, a cidade mais rica da Federação. Muitos colégios já usam filmes como material didático para discussão na sala de aula. O que determina o seu uso não é uma suposta obrigação e sim o fato de que esses colégios têm DINHEIRO para dispor desse método de ensino. Ou seja, não adianta sancionar lei e não dar DINHEIRO para as escolas poderem implantar o que foi sancionado. Que é o que vai acontecer, já que aqui é o Brasil.

Agora, vamos às ilustradas opiniões da "gente de cinema":

Cláudio Assis, diretor de filmes premiados pela crítica 

"O maior gargalo do cinema brasileiro é a distribuição. Fabricamos, fazemos filmes, mas eles não chegam às salas, ficamos a ver navios", diz o diretor de cinema Cláudio Assis. Seus longa-metragens Amarelo Manga (2002), Baixio das Bestas (2006) e Febre do Rato (2011) foram premiados em festivais de cinema nacionais e internacionais e todos receberam o título de melhor filme por um ou mais júri. As produções, no entanto, chegaram a poucas salas de cinema no Brasil.

"Nas escolas vamos ter a possibilidade de contribuir culturalmente para a formação social, a possibilidade de educar a criança para um olhar sobre a realidade brasileira, sobre o cinema brasileiro. O Brasil precisa de formação de plateia", analisa Assis.

Sérgio Rosizenblit, vice-presidente da APACI (Associação Paulista dos Cineastas)

O informe da Ancine mostra que foram 17 estreias de filmes brasileiros no primeiro trimestre nas salas de cinema e apenas cinco tiveram mais de 100 mil espectadores. Segundo o vice-presidente da Associação Paulista dos Cineastas, Sérgio Rosizenblit, a maior parte da produção não é exibida no cinema. Para se ter ideia, apenas em São Paulo estão sendo produzidas 100 obras.

Rosizenblit diz que existem grupos de trabalho discutindo formas de escoar melhor a produção e que um diálogo mais próximo com as escolas poderá entrar em pauta. Com o cumprimento da lei, o cinema brasileiro chegará a mais de 190 mil escolas em todo o país, segundo o Censo Escolar de 2013. O número é bem maior que o de salas de cinema, que, de acordo com a Ancine, são 2.738 no Brasil. "As escolas são essenciais. Vão multiplicar os espaços de exibição."

Na boa, é ou não é a face do desespero? Parece que eles são seguidores daquela velha filosofia: "Se não tem tu, vai tu mesmo!"

Claudio Assis não esconde que a única maneira dos filmes dele serem vistos por uma grande quantidade de pessoas é obrigando crianças nas salas de aula a os assistirem. E formação de platéia obrigando crianças a ver um filme é como dizer que obrigar os alunos a lerem Machado de Assis e Manuel Antônio de Almeida no ensino fundamental serve para aumentar o número de vendas de livros nacionais. 

Já Rosizenblit é mais direto. Ele acha que as salas de aula brasileiras fazem parte do parque exibidor nacional. Antes eram 2.738 salas de cinema. Agora são 192.738 salas (de cinema, de aula, quem se importa?) O pensamento é de dar vergonha em qualquer um que não faça parte do meio do audiovisual ou esteja desesperado para produzir ou exibir um filme.

O que salta aos olhos é como esses dois profissionais estão tão preocupados com seus umbigos que não conseguem ver que a maior razão para se passar filmes em sala de aula, principalmente os brasileiros, seria o ganho que isso traria para os alunos. A questão é, esse ganho virá mesmo? Ou será apenas mais uma daquelas medidas irrelevantes que os governos brasileiros (de todas as épocas) não cansam de tomar para depois deixar que caiam no esquecimento? Não precisa ser o Oráculo para saber a resposta. O cineasta brasileiro quer ensinar com seus filmes, mas antes ele precisa aprender a ter vergonha na cara.

Não queria apelar para esse clichê, mas é o único que me vem a cabeça agora: tem que rir para não chorar.

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