O Bitter Script Reader quer provar um ponto. O de que para se escrever uma comédia, além do talento para fazer piadas, é claro, você tem que pensar em tudo que o roteirista de qualquer outro tipo de filme também tem que pensar. Ou seja: estrutura, personagens, tema, trama, etc. E tudo isso é essencial, assim, é claro, como as piadas. Para isso, ele se apoia numa entrevista de três dos mais memoráveis diretores/roteiristas de comédia de Hollywood, inventores de um sub-gênero que hoje em dia já se saturou um pouco, mas cujos filmes continuam engraçados: Jerry Zucker, Jim Abrahams e David Zucker.
Nos dias de hoje, o termo "spoof movie" (basicamente um "filme de paródia") faz com que nos lembremos de imagens de filmes de caras como Friedberg/Seltzer, e são menos como "Apertem os Cintos o Piloto Sumiu" e "Corra que a Polícia Vem Aí" e mais como sequências reencenadas de filmes recentes com uma piada sobre peido ou sobre a cultura pop inseridos como referência. Filmes como os da série "Todo Mundo em Pânico" parecem menos sátiras dos trabalhos que referenciam e mais como uma série de "Ei, lembra desse momento de um fenômeno da cultura pop de nove meses atrás?" A história é pífia e muitas cenas são nada mais que uma série de gags.
Os papas desse gênero são David Zucker, Jerry Zucker e Jim Abrahams, cujo filme "Apertem os Cintos (...)" praticamente inventou esse gênero. Só Mel Brooks tem a moral de dizer que chegou lá antes, mas há uma loucura e uma densidade nas piadas do trio que talvez "Banzé no Oeste" e "Jovem Frankenstein" não consigam acompanhar.
Esse time fez parecer que era tão fácil com "Apertem os Cintos" que trabalhando em "Top Secret", mesmo eles não pareciam entender o que fez o primeiro filme funcionar.
Estou repostando algumas de suas respostas aqui por que vai no coração do que um filme precisa - uma boa história e estrutura. O resto é a cobertura do bolo.
Jerry Zucker: Nós eramos caras engraçados que não entendiam, não tinham idéia de estrutura narrativa.
Jim Abrahams: "Apertem os Cintos" foi baseado no filme "Zero Hour! ("Entre a Vida e a Morte", aqui no Brasil)," e é a história de um cara com stress pós-traumático e, se você olhar para isso atentamente no filme, é o que Bob Hayes tinha. Ele era assombrado por demônios da guerra e isso afetava a sua personalidade.
(...)
Jerry Zucker: Esse é o problema de fazer um segundo filme depois de um sucesso, todo mundo diz, "Bem, você deve saber." E o fato é, a gente não sabia. Nós sabíamos como contar piadas, mas ainda não entendiamos direito como fazer um filme. Não sei por que alguém não disse para a gente, "Ei, vai fazer um curso de estrutura narrativa."
David Zucker: Nós pensamos que seria um sucesso, por que era engraçado. Nós sabíamos que tínhamos as piadas. Mas acho que aprendemos uma lição.
Jerry Zucker: Eu acho que algumas das nossas melhores piadas estão em "Top Secret!," mas o filme se ressente do fato de não ter uma história. Não tem muito de uma história ou um gancho... (...), nós começamos a perder o gás no final de "Apertem os Cintos," Mas o filme não perde o gás.
Outra lição que eles falam sobre o tema das piadas e as referências:
Jim Abrahams: Especialmente depois de "Apertem os Cintos", nós começamos a nos dar conta das regras da comédia além dos nossos instintos de "faça o que é engraçado ou não." E uma das regras é, se você for parodiar uma cena específica de um filme, tem que funcionar por si mesma. E se você pegar que é a paródia de um filme, bem, é a cereja no bolo.
David Zucker: Quando eu penso sobre isso, foi melhor não fazer um humor que é só referência. E o que há de melhor em "Apertem os Cintos" e "Top Secret" é que ainda são engraçados. Então, quando eu vejo eles com uma audiência, as pessoas ainda riem.
Jim Abrahams: Há uma cena na praia em "Apertem os Cintos" onde Bob e Julie são levados por uma onda. Em resenhas sobre o filme, as pessoas diziam, "Uau, foi uma referência inteligente de uma cena de "A Um Passo da Eternidade." Mas nós não tínhamos visto "A Um Passo da Eternidade." A gente não sabia que era uma paródia, a gente apenas pensou que seria engraçado para um casal na praia ser levado pelas ondas enquanto se beijava. Mas isso nos abriu os olhos que se você está fazendo uma paródia de uma cena de um filme, tem que funcionar se o público pegar ou não a referência.
Comédia é mais do que gags engraçadas. Muitos escritores vão te dizer que as regras para se escrever uma comédia são as mesmas que as para se escrever qualquer outro filme. Construa uma estrutura forte, tenha uma história que faça sentido e delineie personagens que são consistentes. Faça isso e o humor vai surgir naturalmente.
Aqui estão o link para o post do Bitter Script Reader e para a entrevista do trio de diretores/roteiristas:
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